quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Crise: tempo de oportunidades e de decisão

A palavra crise, em chinês, também significa oportunidade; em grego, decisão, atitude. 

O que fazer diante da crise? Ficar parado, inerte, lamentando as coisas? Sabemos que tudo passa. E quando a crise passar? Fizemos algo, trabalhamos, agimos, aproveitamos as oportunidades? O que plantamos durante o tempo da crise? O que teremos para colher quando a crise passar? 

São perguntas que mudam um destino, e que precisamos fazer a nós mesmos.

Paideia

Esta é uma monumental obra do intelecto humano, de autoria de Werner Jaeger, Paideia, A Formação do Homem Grego. 

São quase 1.500 páginas mostrando o ideal grego de formação do homem superior: nobre, virtuoso, livre, belo, inteligente, integralmente bem desenvolvido em todas as suas faculdades do corpo e da alma.

 No centro desse ideal, uma palavra, "areté", excelência, o divino florescendo no homem, ou o homem fazendo parte da sociedade dos deuses.

Aprendendo oratória lendo os elevados Diálogos de Platão

Disse Tácito, historiador romano, no livro Diálogos dos Oradores, que Cícero, o grande advogado, político e tribuno da Roma Antiga, falava que aprendeu oratória mais lendo os elevados Diálogos de Platão do que estudando na escola dos professores de retórica. 

Em suas Catilinárias, conjunto de discursos contra o conspirador Catilina, obra-prima da história da eloquência universal, Cícero introduz a sua poderosa acusação, com a famosa frase, que parece ecoar pelos tempos, todas as vezes que a pronunciamos: "Até quando, Catilina, tu abusarás de nossa paciência". Em latim, ecoa ainda mais forte: "Quosque tandem Catilina abutere patientia nostra".

Os deuses que não morreram

O livro Os Deuses que não Morreram: Ensaios de Cultura Grega, de autoria de Heber Salvador de Lima, é uma excelente obra de introdução ao estudo dos legados que a Grécia Antiga nos deixou no campo da filosofia, do teatro, da escultura, da poesia e da literatura homérica. 

O autor conta como se emocionou completamente ao visitar a Acrópole de Atenas pela primeira vez em 1956: "Tive ali a sensação de imortalidade do gênio grego que aprendi a reverenciar. Senti a exultação de uma Grécia que se recusa a morrer, de uma Grécia eterna. Senti um júbilo interior, senti os abraços e o acolhimento da Mãe -Atenas, a grande cidade-mãe do Ocidente; foi então que percebi que eu era um dos muitos filhos da Hélade espalhados pelo mundo". 

E continua o autor dizendo: "Ignorar os valores gregos que permeiam a cultura ocidental é uma declaração implícita de pobreza intelectual. Este livro quer lembrar que os grandes valores gregos ainda estão vivos. Eles são os Deuses que não Morreram". E diz uma frase que eu acho lapidar: "A crise moderna é, em grande parte, um esquecimento da sabedoria grega".

O poder retórico da língua grega: concisão e profundidade

"O grego é uma língua concentrada. O que em grego se dizia em uma palavra, em latim se precisava dizer em duas ou três", assim fala o professor Amilcare Carletti, autor da obra Grandes Oradores da Antiguidade: Cícero e Demóstenes."Os antigos gregos falavam de forma densa e breve.

Esta qualidade tinha dois aspectos: síntese e autodomínio. Ao primeiro devemos a capacidade de condensar o pensamento e exprimi-lo em tantas palavras quantas bastem, sem mais nem menos. O segundo combate a tentação da verbosidade, sem amplificações desnecessárias.

Foi desses dotes que nasceu o epigrama, frases curtas, concentradas e profundas na maneira dizer as coisas", diz Heber Salvador de Lima, em Os Deuses que não Morreram: Ensaios de Cultura Grega.

"Para os gregos aristocratas do período clássico quem levasse a sério a língua grega eliminaria a ocorrência de elementos infantis e exagerados na forma de falar", aponta Thomas Cahil no seu livro Navegando no Mar de Vinho: Por que a Grécia é Essencial Hoje?

Os textos acima apontam para duas importantes qualidades que um orador precisa trabalhar: concisão e profundidade.

Orador: filósofo, poeta e ator

Conta Hélio Sodré, em seu livro História Universal da Eloquência, que Demóstenes, o grande orador grego, dizia: "Honro tanto o povo de Atenas que não me atrevo a aparecer diante deles com palavras superficiais". 

Quantos oradores não honram seu público, quantos palestrantes não honram seus ouvintes! Lembro-me que em uma palestra que ministrei, assim iniciei meu discurso fazendo referência ao que disse Demóstenes: "Honro tanto este convite que me foi feito, e honro tanto a presença de todos vocês que não me atreveria a estar aqui sem antes ter me preparado, sem antes ter pesquisado o assunto, sem antes ter me dedicado de corpo e alma ao tema que aqui desenvolverei". 

E comecei a falar das virtudes do orador, e mais uma vez recorri a Hélio Sodré: "O orador perfeito deve reunir as qualidades do filósofo, do poeta e do ator. Poeta, filósofo e ator, eis aí, realmente, do que se compõe a personalidade do homem eloquente. Poeta para deleitar e comover, falando ao coração e ao sentimento. Filósofo, para instruir e convencer, falando à razão e ao entendimento. E ator, para dar vida e vigor às suas palavras, sejam elas dirigidas ao cérebro ou ao coração".

Apoteose de Homero

Pintura: Apoteose de Homero, 1826, de Jean Auguste Dominique Ingress. 

A deusa Vitória coroa Homero nas escadarias de um templo grego. Homero, autor de Ilíada e Odisseia, obras representadas pelas mulheres a sua frente, está rodeado de filósofos e sábios antigos e modernos, herdeiros de sua genialidade, que lhe prestam reverência. 

Homero é considerado o poeta maior, o pai dos oradores e o educador de toda Grécia.

Falando grego

"Tá falando grego", é uma expressão que é usada para se referir à comunicação confusa de alguém. 

Isso soa um pouco impróprio, pois um dos grandes legados da Grécia Antiga ao mundo foi a oratória, a arte de bem falar.

 Então, deveria ser exatamente o contrário: quando alguém estivesse falando com clareza, com lógica, com razão, deveríamos dizer com alegria: "Tá falando grego".

Dialética: a razão em exercício

Os antigos sofistas ensinavam que a dialética é a "ratio in exercicio", é a razão trabalhando, é a razão em movimento, é a razão procurando a melhor expressão da verdade.

A palavra dialética, em sua origem etimológica, significa a capacidade para expressar ideias e palavras com lógica, com  largueza e flexibilidade do intelecto.

 Daí já dá pra perceber que a argumentação dialética não é vocação para quem tem mente fechada, rígida e inflexível; mentes assim não são chamadas para desbravar o mundo da oratória nem o mundo da filosofia.

(O quadro que ilustra o texto é uma pintura do século XIX, intitulada O Sofista)

As eloquentes lições do poeta Píndaro

"Homem, torna-te quem és", dizia o grandiloquente poeta grego Píndaro. Como posso me tornar o que já sou? Tornar-me implica algo que ainda não sou. Mas é só quando nos tornarmos o que já somos é que saberemos que sempre fomos o que já somos.

Há outra sentença de Píndaro que diz: "A resignação é um suicídio cotidiano". Tem coisas que precisamos da resignação, mas tem outras que resignar-se significa viver uma vida de mediocridade.

E por derradeiro, outra máxima do poeta: "O dia precedente é mestre do dia seguinte". É vivendo e aprendendo, é cometendo erros que podemos acertar, é com nossas experiências do hoje que podemos viver melhor o dia de amanhã.

De Píndaro, disse Quintiliano, o grande mestre da retórica latina: "Píndaro é o incomparável mestre do lirismo. Inimitável em grandiosidade, na sabedoria das máximas, nas figuras de linguagem e na torrente caudalosa de sua eloquência".

Empédocles: oratória brilhante e personalidade forte


Todo grande orador é um homem de personalidade forte, mas nem todo homem de personalidade forte é um grande orador. 

Nos estudos da história da oratória não encontramos nenhum grande orador de personalidade fraca. Aristóteles considerava o filósofo Empédocles o pai da retórica, porque Empédocles foi mestre de Córax de Siracusa, e este, influenciado pelo seu mestre, escreveu o primeiro tratado de retórica que se tem notícia, Tekné Retoriké. Empédocles também foi mestre de Górgias, o grande sofista grego.

 O que tem a ver tudo isso com a tese de que todo grande orador é um homem de personalidade forte? Tem tudo a ver, pois as características mais marcantes de Empédocles foram duas: personalidade forte e oratória brilhante. Na própria raiz da história da arte de falar bem encontra-se a presença de homens de personalidades marcantes.

Defender com igual excelência teses opostas

Além de grandes oradores, os sofistas também eram exímios escritores; eles escreviam discursos para que as partes lessem nos tribunais e nas assembleias, por isso eram chamados de logógrafos - aqueles que elaboravam discursos escritos.

 Às vezes um mesmo logógrafo escrevia com excelência as razões de ambas as partes de uma mesma demanda. Para esses grandes professores da arte da palavra nenhum aluno poderia se considerar preparado se não fosse capaz de defender e atacar uma mesma tese com igual competência, pois só assim era possível o discípulo provar que tinha adquirido os recursos da dialética e desenvolvido os poderes da argumentação.

Firmes na marcha dos séculos

Nesse mês comemoramos também o Dia do Advogado, profissão que teve origem na Grécia Antiga. 

Sólon, legislador e jurista grego, um dos Sete Sábios da Grécia, no século VI a. C., decretou uma lei determinando que para ser advogado o homem deveria saber falar, ser livre e ser honesto. A advocacia tem raízes nestes belos valores. Não é uma profissão para escravos, desarticulados e desonestos.

 Que todos os advogados possam seguir firmes na marcha dos séculos honrando a nobreza e a antiguidade desta profissão, que é filha ilustre da liberdade, que é irmã gêmea da democracia, que é mãe guerreira do humanismo.

O domínio do léxico

Léxico é o conjunto das palavras de uma língua, de um lugar, ou de uma determinada área do saber. 

Este livro, Léxico da Filosofia Grega e Romana, de Giovanni Reale, é um rico acervo das palavras filosóficas da antiguidade. 

Destaco duas destas palavras, muito usadas pelos seguidores do filósofo Pirro, que viveu na Índia por 10 anos, e que muito aprendeu com sábios hindus, traduzindo aqueles ensinamentos para a linguagem grega: "ataraxia" (imperturbabilidade dos sentimentos) e epoché (suspensão dos julgamentos, opiniões, pensamentos, ausência de perturbação na mente). 

Quando o homem domina o léxico de sua língua, e quando, somado a isso, têm a alma, a mente e o coração imperturbáveis, calmos, o filósofo, o orador, o líder, alcança um alto poder de percepção da verdade e um alto poder de argumentação e transmissão persuasiva desta verdade.

Comunicação na Grécia Antiga

Comunicação na Grécia Antiga: Reflexões para a Mídia do Século XXI, do professor Roberto C. G. Castro, doutor em filosofia pela USP, é uma obra ímpar; dedicou-a aos seus alunos "na esperança que os gregos antigos inspirem sua trajetória profissional".

Além de mostrar a origem e o cultivo da oratória pelos gregos, desde os eloquentíssimos personagens da Ilíada e da Odisséia, o professor Roberto vai traçando, ao longo da obra, uma série de lições preciosas de grandes pensadores gregos sobre a arte da comunicação. 

Com os fundadores da retórica, Córax e Tísias, podemos aprender que a oratória deve ser racional, objetiva, baseada em provas e demonstrações. 

Com os oradores pitagóricos podemos aprender a tornar a palavra cativante, sedutora, mágica. Com os sofistas podemos aprender a perfeição da forma e a perícia na arte da argumentação. 

Com Sócrates e Platão podemos aprender que a oratória precisa ter filosofia, conhecimento, profundidade. 

Com Aristóteles podemos aprender que a ética, a honestidade, a credibilidade do orador é peça fundamental no processo persuasivo. 

Com Isócrates podemos aprender que a oratória deve estar a serviço da educação e da formação do homem-cidadão. 

Com Demóstenes podemos aprender a colocar a oratória acima de nossos interesses particulares; ela deve estar à serviço da liberdade, da democracia e da união entre os povos. 

Terá uma oratória de alta qualidade, de alto impacto, de alto poder, o orador que souber reunir em si mesmo as ideias inspiradoras desses grandes gênios da Grécia Antiga.

Espíritos de curto alcance

"Victor Hugo, gênio verbal inexcedível, comparou o tribuno ao semeador. Todos os cérebros são para ele campos, aos quais lança às mãos cheias, ideias, sonhos.

 Diz o velho poeta:

 'Uma palavra caída de uma tribuna cria sempre raízes em alguma parte. Dizeis: 'não é nada, é apenas um homem que está falando'. Espíritos de curto alcance! Dizeis que não é nada, e é um futuro que germina, é um mundo que desabrocha'".

 (Hélio Sodré in História Universal da Eloquência)

O Dia do Filósofo

Nesse mês de agosto foi comemorado o Dia do Filósofo. 

É um filósofo que é considerado o Pai da Retórica, Empédocles. 

Da filosofia nasce muitos saberes. 

E como diz o pensador brasileiro Huberto Rohden "todos temos potencial para sermos filósofos". 

Quem ama a sabedoria, o conhecimento, a virtude, a reflexão racional, é um filósofo.

Presente de grego e presente dos gregos

Precisamos diferenciar "presente de grego" e "presente dos gregos". 

"Presente de grego" é uma expressão que indica algo enganoso por trás de uma oferta.

É um dizer que surgiu decorrente da Guerra de Troia, quando os gregos ofereceram de presente aos troianos um enorme cavalo de madeira. Os troianos pensaram que aquilo era uma rendição e um reconhecimento da vitória de seu exército, tendo em vista que as tropas gregas simplesmente sumiram da região. O enorme cavalo foi levado para dentro dos portões da cidade, e durante toda a noite os troianos se embebedaram comemorando a vitória. Quando os troianos estavam dormindo, os gregos que estavam dentro do cavalo saíram e abriram os portões da cidade, que foi invadida pelo exército grego, chegando assim, ao fim, a Guerra de Troia, com a vitória grega. 

Já a expressão "presente dos gregos", é outra coisa, é o legado da Grécia ao mundo: a oratória, a advocacia, o júri, a democracia, os jogos olímpicos, a escola, o teatro, a filosofia, a rica e perene cultura helênica.

O silêncio e a oratória de Pitágoras

Qual o segredo da extraordinária eloquência de Pitágoras, filósofo grego do século VI a.C.? 

Qual o segredo de sua oratória mágica que encantava os jovens da cidade de Samos e de Crotona, e tocava a mente e o coração de seus ouvintes com palavras sublimes e profundas? 

Numa frase que ele mesmo dizia estava o segredo do poder de seu verbo: "Se o que tens a dizer não é mais belo do que o silêncio, então cala-te".

O dialético vê o todo

"Quem é capaz de ver o todo é um dialético; que não, não é". 

Com isso, Platão quer dizer que um bom argumentador, que um bom orador é aquele que é capaz de ver todos os ângulos de uma questão. 

É limitado o orador que se fecha, que só ver a tese que defende; é estreito, é dogmático - coisas incompatíveis com o bom debatedor, com o bom líder. 

Para poder ver o todo, o orador precisa estudar o tema, ter mente flexível, aberta e honesta diante das muitas possibilidades de visão de um mesmo assunto. 

Platão está falando de uma qualidade essencial da arte de falar bem com filosofia, desenvoltura e amplidão.

O curso do dizer

Discurso significa o curso do dizer. 

Curso do dizer implica direção, fluência, ordem, clareza, objetividade, concisão. 

Não discursa realmente aquele que fala confuso.

A musa da eloquência

Das nove musas da mitologia grega, Calíope é a primeira, a mais bela, a mais sábia e a mais influente de todas, por isso, a rainha das musas. 

É a musa da eloquência. Tem na cabeça uma coroa de louro, mostrando sua íntima ligação com Apolo, o deus da beleza, da sabedoria, da luz e da razão. Tem um semblante compenetrado e meditativo mostrando sua aguda percepção daquilo que é capaz de convencer, e que a tudo registra na tábua que leva em suas mãos. É dotada de califasia, califonia e calirritmia, ou seja, tem o dom da expressão correta das palavras, o dom da bela voz e o dom da harmonia no ritmo do dizer.

 Em outras representações artísticas carrega nas mãos os livros fundantes da educação grega, por ela inspirados: Ilíada e Odisseia, de Homero, Eneida, de Virgílio, e um outro livro, onde está escrito persuasão. Os romanos antigos a chamavam de 'Suade'. Aqueles que falam com carisma e magia, entusiamo e inspiração, falam movidos 'per-suade', pela deusa da eloquência, pela deusa da persuasão.

A luz dos helenos

Os gregos chamavam a si mesmos de helenos, e a sua pátria de Hélade, e a sua cultura de helenística. Ainda hoje o nome oficial da Grécia é República Helênica. Grécia é como os romanos a chamavam. 

Acredita-se que Heleno, descendente de Hélio, como os gregos denominavam o sol, foi o fundador da Hélade. A civilização grega sempre esteve ligada ao sol. A luz do sol brilhou na arte, na literatura, na oratória, na política, na arquitetura, na mitologia, de maneira inapagável. 

Essa luz precisa ressurgir, renascer, novamente brilhar em todos os campos do saber humano. A luz continua a iluminar sempre, como uma vela capaz de acender milhares de outras, mas se espera do homem a aproximação, o reconhecimento e a reverência à luz, a sofheía, em grego; palavra que gerou sofia, que gerou sabedoria.

Positividade e bom raciocínio

A negatividade prejudica o raciocínio. 

A persuasão tem a ver com uma atitude mental positiva. 

Diz Napoleon Hill, em seu livro Chaves para o Sucesso, que "um advogado pode por tudo a perder, mesmo sua causa sendo boa, se ele comparecer diante do juiz ou dos jurados com uma atitude mental negativa".

Já pude constatar isso por experiência própria: positividade traz força persuasiva; negatividade espanta o poder de convencimento do homem. Vale a pena investir na nossa capacidade verbal desenvolvendo nossa positividade.